quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Saber da Falta


Não saber... já dizia um grande nome da psicanálise sobre douta ignorância, que não sabe mas que não impede advir o saber. É mais ou menos o que o Sócrates falava, que nada sabia e ainda assim era o mais sábio. Claro, quem acha que sabe nunca pode aprender, e saber de tudo é meramente impossível a qualquer ser humano. Por isso é bem melhor uma postura de aprendiz do mundo do que de achar que sabe e só fazer besteira. E quando abordamos isso não só com relação ao mundo, mas aplicamos principalmente às pessoas, achar que sabe, que entendeu, literalmente é um desastre. É claro que em certa medida é necessário para a convivência. Imagina você ter que ficar se questionando tudo toda vez que ouvir e até mesmo falar. Mas há situações que é necessário suspender esse saber que a gente acha que tem sobre as outras pessoas. É porque “cada cabeça uma sentença” e vai lá saber qual é a sentença que o outro tem, né? E ainda duvido que ele próprio saiba de sua própria sentença. Ta mas isso fica para outro dia...
Mais uma vez seria maravilhoso se tudo bem, a gente suportasse não saber. Seja esse saber qual for, seja em relação à profissão, ao amor, ao mundo, à razão, à emoção. Suportar esse não saber nosso em relação ao outro é algo que nos fere profundamente. Pare para pensar, algo que você acha que sabe, ou acredita... (pensou?) agora imagine que talvez isso que você acha que sabe não vale muita coisa. Eita, estamos meio que ilhados. Acho que é assim mesmo, ilhado, por todo lado que você olhe é um oceano do que desconhece, e o pequeno ponto sólido que está nem é tão firme assim. Está sobre as águas. É até de emudecer quando você pensa que as coisas não são fixas, o saber não é algo palpável, depende do tempo do espaço que aconteceu, de quem viveu, como viveu. De repente chego a pensar como é viver na pele de Sócrates, pois ele valorizava o que estava por aprender e não o que sabia. De certa forma é verdade, o que você sabe não te ajuda muita coisa além do que já conseguiu. E é porque esses saberes que a gente tem algum dia falhou que procuramos uma outra explicação.
Mas ainda continua... Suportar não saber, retirar seus paradigmas tão confiantes é te deixar só, é te deixar sem era nem beira. Ta... sabemos que essa é a condição do ser humano, ta bom, mas é a SUA, a MINHA, aí sim sentimos o chão se perder em baixo de nossos pés. Nossa cultura sempre valorizou o saber, o intelecto, explicações... e quando entramos para o interior de nossos quartos, pensamos, mas sobre o que é que eu sei mesmo? E se não sei, como será? Pouco valorizamos a falta que produz a invenção. Penso assim como será que Deus pensou em construir o mundo? Tipo, “vou construir” e pronto? Algo tinha colocado aí, uma falta... de uma falta advém uma criação, uma invenção. Só valorizamos o que construímos, sem nos preocupar com o que nos faltou, e do porquê tal saída não outra. Olha só, os inventores tiveram que criar seus inventos por uma falta. Sei de uma historia bem legalzinha, não é interessante como a historia da luz ou do telefone, mas aposto que você já usou: o cara que inventou o band-aid, ele o fez porque sua mulher machucou a mão e não podia fazer os curativos necessários. Então ele ao sair para o trabalho preparava todos os curativos que ela iria usar. O que é isso? É inventar diante da falta! Todo mundo hoje usa o band-aid, mas ninguém deu valor à saída que ele deu, ao que ele passou. Poxa imagina a mulher dele, ele agüentando a mulher falando que não dava conta, e ele coitado também certamente até então não dava. Mas ele construiu com a falta. Somos valorizados pelo que temos e não pelo que podemos construir. É como se o fato de ter algo desse plenos poderes para ter o resto, e não é, ter é limitado. Não se pode ter tudo, mesmo porque ter tudo é o que? Então... é interessante começarmos a pensar como seria o mundo se valorizássemos não o que temos, mas o que podemos fazer, construir, inventar... o que fazemos com as nossas faltas?

3 comentários:

Iara W. Biondi disse...

Nossa nem tinha pensado qts sentido podem se tirar desse titulo!
1) saber sobre a falta;
2) saber produz a falta;
3) o saber que a falta emerge...
mas acho q todos eles são consoantes com o texto... o que acham???

Bia disse...

Às vezes me pego pensando até que ponto é bom saber. No fundo, não acredito que haja alguém com tamanha pretensão em pensar que sabe tudo ou o suficiente. Inconscientemente, todos sabem (!) que isso é impossível.
Bem, é um assunto muito interessante!

Anônimo disse...

Muito bom esse artigo de hoje.
Saber em muitas ocasiões é apenas enxergar o óbvio, o simples.
O sábio geralmente vê soluções para algumas inquietações da vida que depois de ditas, os menos sábios se perguntam: Porque não pensei nisso?